sábado, 31 de outubro de 2009

PÃO-POR-DEUS



Batem à porta!
Quando a abro vejo um grupo de três ou quatro crianças disfarçadas de bruxas, vampiros e outras figuras que não consigo identificar. Sorriem-me enquanto me apresentam os seus sacos à espera que lá coloque guloseimas, mas não ouço a frase que deveria acompanhar os seus gestos: "guloseimas ou travessuras". Mesmo assim respondo às suas expectativas.
O cenário repete-se ao longo da noite. 
O que é feito do nosso Pão-por-Deus?

sábado, 24 de outubro de 2009

OS "MEUS" MENINOS




O Paulo está pela primeira vez no 7º ano. Tem um sorriso tímido, levanta o dedo a pedir licença para falar, o que faz com frequência na minha aula, é que Matemática é a sua disciplina preferida. Quando acaba a leitura de um enunciado, inicia de imediato a resolução do exercíco e enquanto espera que os colegas terminem, entretém-se inventando novas perguntas. Com os olhos a brilhar por detrás dos óculos, põe o dedo no ar e pergunta: "Ó professora, e se no problema ainda pedisse..." Para ele a aula passa rápido. Gosta de aprender e gosta de fazer coisas que a maior parte dos seus colegas classificariam de chatas: ler e inventar construções em Lego. Um dia vai ser engenheiro...
O Henrique também frequenta o 7º ano pela primeira vez. Sentou-se no primeiro dia na fila da frente, "para ver melhor o quadro". Usa óculos de lentes grossas numas armações todas "fashion", e um brinco em cada orelha, quadrados preenchidos com brilhantes de vidro. Espeta o cabelo curto com gel e é moreno, daquela cor que só os meninos de rua conseguem ter. Preferia estar a trabalhar com o pai nas obras, a "amarrar ferro", do que frequentar a escola, mas o seu sonho era ser como o Cristiano Ronaldo. Quando lhe peço para ler uma questão em voz alta, lê muito devagar, junta as letras, depois as sílabas e por fim sai a palavra. Ao terminar a leitura, volta a ler tudo para si, a ver se entende a pergunta. Depois sai-lhe a resposta de rompante. Se está correcto, o que acontece raramente, diz todo satisfeito: "Sou esperto, não sou professora?"

Em cada novo ano lectivo sinto que, na minha escola, aumenta o número de meninos como o Henrique. A minha grande interrogação é como ensinar estes meninos que os pais enviam para a escola por obrigação e que permanecem lá contra a sua vontade. São alunos que chegam ao 7º ano de escolaridade sem terem, ao menos, desenvolvido competências básicas como as de leitura e de cálculo e que não revelam gosto em aprender. Não valorizam a cultura escolar e não compreendem a sua linguagem. Ensinar estes meninos é um grande desafio, penso que o maior que hoje se me apresenta, em termos profissionais.


Durante estas semanas em que estive ausente, senti saudades deste cantinho e dos vossos, mas o tempo para escrever e para vos visitar faltou-me.  Espero que agora seja o regresso a este espaço.